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Do Medo à Autonomia: uma reflexão sobre inclusão e o papel das famílias

Caras famílias, observem a forma como vocês tratam e falam sobre as pessoas com deficiência. Muitas vezes, o capacitismo começa dentro de casa. Nosso papel é fundamental para garantir a autonomia de nossos filhos, e a luta por seus direitos deve começar conosco, derrubando as barreiras que ainda restam.

Ao longo da história da humanidade, as atitudes em relação a crianças nascidas com deficiência foram, muitas vezes, bizarras, sombrias e excludentes. Ao contrário da valorização que damos a coisas raras e únicas, essas crianças com traços ou características diferentes do padrão eram vistas como “feias, problemáticas ou, em casos extremos, inúteis.” Na visão da sociedade, eram “anormais” por nascerem “com defeito.” Muitas famílias mantinham essas crianças escondidas, em ambientes protegidos com parentes (no melhor dos casos) ou as entregavam a instituições, como se fossem doentes, sem o direito de participar ativamente da vida.

Felizmente, como sociedade, já avançamos. Nossos conceitos de humanidade e civilização evoluíram, e junto com eles, a compreensão sobre o que é deficiência. Hoje, a Convenção Nacional da Pessoa com Deficiência define, no artigo 1º, que “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Foi, portanto, apenas em 2016, que o Brasil deu um passo importante ao reconhecer juridicamente que as barreiras sociais, e não apenas as limitações individuais, podem agravar ou aliviar a deficiência. Existe a limitação da pessoa, mas é a interação com o ambiente que a intensifica, minimiza ou até mesmo a elimina. Isso reforça a importância de um ambiente inclusivo, onde essas barreiras possam ser reduzidas ou eliminadas para garantir o acesso igualitário a todas as atividades sociais, culturais, econômicas e educativas.

Reconheço que nada se transforma de uma hora para a outra e que mudanças culturais, no entanto, são lentas. Então vale a reflexão: onde e como nos situamos nesse movimento? Exatamente como estamos contribuindo para essa transformação?

Observando em perspectiva, é fácil compreender a atitude de superproteção de mães, pais e avós, afinal, o mundo ainda é hostil para aqueles que não se encaixam no sistema. São inúmeros exemplos e fatos que reforçam a atitude das famílias que não expõem seus filhos por medo. Proteger é um instinto natural, principalmente para as mães, que protegeríamos eternamente qualquer filho. Contudo, o excesso de proteção pode acabar comprometendo a autonomia e o desenvolvimento de quem mais precisa aprender a lidar com o mundo.

Lembro da primeira vez que o Nico saiu sozinho pela rua, com apenas dez anos. Eu o segui, escondida, saltando de árvore em árvore, com o coração acelerado. Fiz o mesmo com Camilo quando ele foi comprar figurinhas na banca de jornal da esquina pela primeira vez. Esse dilema entre querer mantê-los por perto e saber que é preciso deixá-los explorar o mundo é universal. Para as crianças, o desconhecido é fascinante; para nós, pais, é uma fonte constante de preocupação. Mas se não permitirmos que eles experimentem esses novos horizontes, como irão aprender a explorar seus próprios desejos, reconhecer seus limites e descobrir suas conquistas? Até quando adiar a exposição de um filho aos riscos inerentes à vida? 

Lembro da primeira vez em que pedalei uma bicicleta sozinha ao redor do quarteirão. A adrenalina da liberdade me fazendo sentir a emoção de viver em um mundo grande diante de meus olhos e manobras! Naquele momento, não me preocupava com os perigos, mas sim com a conquista. Se eu tivesse permanecido em casa, ouvindo apenas sobre os riscos (que, sem dúvida, existem), jamais teria descoberto o prazer de aprender por conta própria, de entender meus desejos e reconhecer meus limites.

Proteger é parte da função materna, não há dúvidas, mas isso não significa isolar. Não há vida sem risco, e a verdadeira questão é encontrar o equilíbrio entre exposição e risco. Não significa que é preciso viver no perigo, tampouco que se pode evitá-los para sempre. Entre essas bordas, é preciso viver, com ou sem deficiência. Não vivemos mais numa era em que as pessoas com deficiência eram vistas como doentes que precisavam ser isoladas. Nossa sociedade hoje reconhece que elas têm o direito de participar de forma plena e ativa.

E cabe às famílias ajudar a pavimentar o caminho para essa real inclusão.

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