Costa Rica e a natureza que acolhe tudo
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Publicado em: 03/10/2024 | Por: Flávia Poppe | Jornada da Flavia
Lucien, meu marido, foi transferido para San Jose, Costa Rica, em maio de 1992. Eu deixei meu trabalho no Ministério da Saúde e embarcamos juntos com nossos filhos: Camilo, de três anos, e Nico, com apenas 8 meses. Tivemos a sorte de vivenciar os primeiros sinais do desenvolvimento atípico de Nico nesse país de “pura vida”. Para chegar ao Atlântico ou Pacífico, enfrentávamos estradas esburacadas e cheias de curvas. Mesmo assim, sempre que possível, seguíamos rumo ao paraíso de praias como Manuel Antonio, Punta Leona, Punta Uva, e Guanacaste. Nessas viagens, aprendi a lidar com os vários tipos de enjoos das crianças e, apesar dos contratempos, sempre valia a pena.
Estar na natureza era um refúgio. Com um filho pequeno que ainda não falava, mas apenas gritava e chorava, a imensidão da natureza nos acolhia e trazia uma sensação de alívio e liberdade. Nico sempre ficava mais tranquilo no final da tarde, mais atento, aberto para conhecer coisas novas e se expressar. Vimos muitos pores do sol deslumbrantes, com o mar dourado contrastando com as areias escuras e os tons azulados do céu mudando com o cair da noite. Nessa hora, mesmo sem saber andar, Nico se arrastava, empurrando o bumbum até chegar às ondinhas que quebravam na areia. Ele adorava! Quando uma onda mais forte o derrubava, eu o pegava, ria, beijava, e o colocava de volta – como uma tartaruguinha voltando ao mar.
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Em uma manhã na praia de Manuel Antonio, acordamos cedo e, antes de atravessar um rio de cerca de 100 metros, encontramos um senhor vendendo abacaxi descascado na hora. O sabor era indescritível: doce como mel, suculento, escorrendo pelas mãos… Era o início de um dia perfeito. A trilha que nos levava a parte mais tranquila da praia era magnífica, sombreada e cercada de uma vegetação tropical exuberante. Cruzávamos com iguanas (que me pareciam mini crocodilos), macacos, pássaros de várias espécies, e as cores vibrantes do verde ainda úmido do orvalho. Repetimos esse programa durante os quatro anos que vivemos por lá, até o Nico também conseguir atravessar o rio a pé. A natureza nos envolvia em sua paz, a vegetação tropical úmida com milhares de tons de verdes que brilhavam quando ainda guardavam o orvalho da noite. Era tudo muito bonito.
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Foi nesse cenário que percebi que a melhor “intervenção” para meu filho com desenvolvimento atípico era a própria natureza – sua beleza, amplitude e silêncio. Ele continuava se comunicando com seus gritos – “berrinches” foi a primeira palavra que aprendi em espanhol – mas nossa família se nutria daquela tranquilidade, o que nos dava forças. Mais tarde, aprendi sobre o “manejo de crises”, algo necessário à medida que Nico crescia. A natureza não cura, mas acolhe. Essa experiência na Costa Rica me ensinou a reconhecer, a lidar e a dosar com o estresse natural da vida cotidiana.
Até hoje, procuro sempre uma árvore florida no meio do trânsito, um pouco de cor e tranquilidade no caos da cidade, um contraste atraente. Sim, existem muitos dias nublados, tristes, cheios de angústia, mas tudo passa. Até mesmo a Costa Rica.
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* Fotos de domínio público